A MICROPOLÍTICA DO MICROTRABALHO: CARTOGRAFANDO AFETOS ENTRE TRABALHADORES/AS DE PLATAFORMAS
INTRODUÇÃO: O presente estudo aborda a micropolítica do microtrabalho, uma modalidade de trabalho plataformizado caracterizada pela execução de tarefas repetitivas para o treinamento de inteligências artificiais. Inserido em um contexto de crescente precarização e informalidade, especialmente no Sul Global, o microtrabalho invisibiliza o trabalho humano por trás de uma aparente neutralidade maquínica. Embora a literatura nacional tenha explorado o perfil e os impactos socioeconômicos desse fenômeno, pouco se sabe sobre como os trabalhadores brasileiros vivenciam subjetivamente este processo e articulam estratégias de resistência. Esta pesquisa investiga essa lacuna, partindo do referencial da Psicologia Social do Trabalho e do conceito de que os afetos exercem papel central na produção de subjetividades e em suas implicações políticas. OBJETIVOS: O objetivo geral foi compreender como as dinâmicas afetivas se entrelaçam às estratégias micropolíticas dos trabalhadores de plataformas, articulando experiências de isolamento e organização. Especificamente, buscou-se mapear as experiências singulares e as condições de trabalho, identificar os principais temas de discussão nas redes sociais de apoio e analisar como os discursos e práticas expressam formas de reprodução ou resistência aos mecanismos de controle do microtrabalho. MATERIAIS E MÉTODO: A pesquisa se ampara em uma metodologia qualitativa de inspiração cartográfica, combinando a etnografia digital (netnografia) com entrevistas semiestruturadas. A netnografia foi realizada em comunidades online de trabalhadores, enquanto as seis entrevistas em profundidade foram conduzidas com quatro homens e duas mulheres, de diferentes regiões e escolaridades, recrutados a partir do monitoramento dessas redes e pela técnica de “bola de neve”. A análise dos dados foi realizada a partir da técnica de triangulação, confrontando as narrativas com os registros etnográficos e o referencial teórico do estudo para a definição de categorias temáticas. RESULTADOS: Os resultados apontam que o microtrabalho é majoritariamente uma fonte de renda extra, marcado pela falta de suporte das plataformas e por uma constante exigência de estudo e qualificação que não se traduz em reconhecimento ou ascensão profissional. Emergem como temas centrais a arbitrariedade algorítmica, a falta de transparência e a ausência de canais de defesa. Os grupos de mensagens instantâneas surgem como uma “ferramenta poderosa de ajuda mútua”, essencial para a troca de informações e superação de dificuldades, mas que também reproduzem dinâmicas de competição e medo de punição, levando à comunicação em canais privados. Evidenciou-se, ainda, uma acentuada dificuldade de contato e uma invisibilização das trabalhadoras mulheres. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Conclui-se que os trabalhadores desenvolvem complexas estratégias micropolíticas para navegar em um ambiente de extrema precarização. As dinâmicas afetivas são ambivalentes, promovendo tanto o isolamento quanto redes de solidariedade. Essas redes informais, embora constituam a principal forma de resistência e suporte, são atravessadas por lógicas de controle e competição, demonstrando como a subjetividade dos trabalhadores é continuamente produzida e disputada no capitalismo de plataforma.
PALAVRAS-CHAVE: Microtrabalho; Trabalho de Plataforma; Subjetividade; Afetos; Precarização.
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